A obesidade é hoje um dos maiores problemas de saúde – tanto pública, como individual. É frequentemente apelidada de ‘epidemia’ e há boas razões para isso. A Organização Mundial da Saúde estima que 600 milhões de adultos no mundo inteiro sejam obesos, o problema já tem pelo menos três décadas de existência e sabe-se que o sobrepeso e a obesidade aumentam a morte por todas as causas, com especial destaque para as doenças cardiovasculares e alguns tipos de cancro.

Em linha com outros países industrializados, Portugal apresenta números preocupantes. De acordo com o documento Retrato da Saúde, da Direção-Geral da Saúde, em 2017, 57 por cento dos portugueses tem excesso de peso, o que inclui pré-obesidade e obesidade. Um valor que corresponde a 5,9 milhões de portugueses. Nos idosos, de acordo com a mesma fonte, a percentagem sobe para 81.

1) O que é a obesidade e como é feito o diagnóstico?

A Organização Mundial de Saúde (OMS) define a obesidade como o excesso de gordura corporal acumulada no organismo que pode afetar a saúde. A forma mais simples e mais universal de a aferir é o Índice de Massa Corporal (IMC), que relaciona o peso com a altura. A fórmula deste índice é definida pelo peso do indivíduo dividido pelo quadrado da sua altura. IMC= peso (kg) / (altura (m) × altura (m)). O valor que surge como resultado enquadra o peso do indivíduo da seguinte forma:

IMC  

Classificação

Igual ou inferior a 18,5

Baixo Peso

18,5 a 24,9

Peso normal

25 a 29,9    

Pré-obesidade

30 a 34,9  

Obesidade grau 1

35 a 39,9  

Obesidade grau 2

Igual ou superior a 40     

Obesidade grau 3

Assim, acima de 24,9 de IMC há sobrepeso e, acima de 30, obesidade. Apesar disso, o IMC deve ser considerado apenas um guia. Como refere a Associação Portuguesa de Nutrição, apesar de muito útil, esta fórmula não indica qual a gordura corporal. Assim, duas pessoas com o mesmo valor de IMC podem ter percentagens de gordura corporal muito diferentes caso, por exemplo, uma delas seja atleta.

Para um diagnóstico correto, deve ser usada uma balança de bioimpedância, que avalia a gordura corporal. Caso não seja possível, deve ser usado o método da medição da circunferência da cintura. “Há doentes que têm os braços e pernas finos, não têm gordura periférica, mas têm muita gordura visceral – a gordura ‘má’ que se acumula na zona da cintura. Os valores da circunferência da cintura devem ser até 101 centímetros nos homens e 88 nas mulheres”, explica o cirurgião Rodrigo Oliveira, coordenador do Departamento de Cirurgia Bariátrica e Metabólica do Hospital da Cruz Vermelha.

2) Quais são as causas da obesidade?

A ideia de que a obesidade resulta apenas de sucessivos balanços energéticos positivos – em que a quantidade de energia ingerida é superior à quantidade de energia despendida – está hoje ultrapassada. “A ingestão calórica é um fator importante, mas não é o principal. O nosso metabolismo é fortemente condicionado pela genética. A máquina metabólica funciona de maneira diferente em cada pessoa e as neurohormonas intestinais como a adiponectomia, grelina, adiponectina e os peptídeo YY, têm um papel preponderante no ganho de peso”, defende Rodrigo Oliveira.

Foi, de resto, por esta razão que o conceito de cirurgia bariátrica deu lugar ao conceito de cirurgia metabólica. Esta mudança aconteceu “porque começámos a perceber que o doente obeso deixava de ter diabetes antes de deixar de ser obeso: a cirurgia muda o metabolismo”, explica o cirurgião. “A cirurgia de obesidade não é uma opção do doente, é uma indicação médica. Qualquer doente que tenha uma obesidade de grau dois (acima de 35 de IMC) estável há mais de 3 anos tem indicação para fazer a cirurgia”, afirma o especialista.

3) A quem se deve recorrer para tratar a obesidade?

O facto de a obesidade ter uma forte componente genética não implica que o papel do estilo de vida deva ser minimizado, sobretudo na prevenção da doença. Ao contrário do metabolismo genético, as opções que fazemos podem ser controladas e têm impacto no peso. “Além da avaliação metabólica, a primeira abordagem a um doente com um IMC elevado e com uma cintura abdominal acima dos valores passa pela tentativa de correção de todos os erros de estilo de vida que faz: a forma como mastiga, a alimentação que adota, o exercício físico que pratica”, detalha Rodrigo Oliveira.

Tendo em conta a complexidade da doença, o tratamento exige uma abordagem multidisciplinar. “No mínimo, o doente deve ser acompanhado por endocrinologista, cirurgião metabólico, psicólogo, nutricionista e educador físico”, defende o cirurgião. Além disso, na maior parte das vezes também se justifica que haja uma avaliação de um cardiologista, pelo risco de doença cardiovascular aumentado do doente obeso. Por outro lado, o dentista pode ajudar a perceber que tipo de mastigação faz: mastigar corretamente é a primeira fase do processo digestivo e é importante para a sensação de saciedade. Quando a mastigação é escassa a absorção dos alimentos não é tão eficaz, o que pode levar a pessoa a comer demasiado.

4) Qual é a relação entre obesidade e disfunções urinárias?

A obesidade está identificada como um dos principais fatores de risco para vários tipos de disfunções urinárias. Nomeadamente, os sintomas do trato urinário inferior (STUI), a incontinência urinária e a bexiga hiperativa.

Existem vários mecanismos que explicam esta relação, a começar pela fragilidade dos músculos do pavimento pélvico. “Nós controlamos os esfíncteres através dos músculos do pavimento pélvico. A obesidade faz com que, por um lado, estes músculos atrofiem e percam força. Por outro lado, o excesso de gordura dentro do abdómen faz aumentar a pressão sobre a bexiga”, justifica Rodrigo Oliveira. A diabetes mellitus é outro mecanismo que liga obesidade e disfunções urinárias. A obesidade aumenta o risco de diabetes, que é um dos fatores de risco da síndrome de bexiga hiperativa.

estudos que mostram que uma diminuição acentuada de peso, após cirurgia bariátrica, leva a uma melhoria significativa das queixas urinárias em mulheres. De tal forma que uma das atuais recomendações para a abordagem a doentes com bexiga hiperativa e incontinência urinária é a perda de peso.

5) Que medidas de estilo de vida ajudam a prevenir e tratar a obesidade?

O estilo de vida é determinante tanto na prevenção da obesidade como no seu tratamento, mesmo quando é feita também uma cirurgia. O Healthline e a John Hopkins Medicine deixam os seguintes conselhos para a prevenir e combater:

  • Consuma menos gorduras ‘más’ e mais gorduras ‘boas’: as gorduras polinsaturadas podem melhorar os níveis de colesterol e reduzir o risco de obesidade.
  • Reduza a ingestão de alimentos processados: estes alimentos, quase sempre ricos em gordura, sal e/ou açúcar, estão associados a um maior risco de obesidade.
  • Coma vegetais e fruta: a recomendação diária para a ingestão de fruta e vegetais é de cinco a nove porções por dia para adultos.
  • Coma alimentos ricos em fibra: os estudos mostram que as fibras desempenham um papel na manutenção do peso.
  • Mastigue bem os alimentos: Comer devagar e mastigar bem é essencial para a correta digestão e absorção dos alimentos.
  • Aprenda a planear: é mais fácil fazer compras saudáveis ​​quando há uma lista que ajuda a evitar tentações.
  • Mantenha um diário alimentar: anote o que come, onde come e como se sente antes e depois de comer.
  • Aprenda a ler os rótulos: é importante saber o que está a comer quando comprar produtos embalados ou enlatados.
  • Pratique atividade física aeróbica regularmente: as atuais recomendações são de 150 minutos de atividade aeróbica moderada ou 75 minutos de atividade aeróbica vigorosa por semana.
  • Envolva a família: tanto no campo da alimentação como do exercício físico, incluir as pessoas próximas pode ajudá-lo a manter um estilo de vida mais saudável.

 

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