“Não está estabelecido de forma categórica e científica que a gravidez predisponha à síndrome de bexiga hiperativa, não é considerado um factor major de predisposição.” O esclarecimento é dado por Sofia Alegra, ginecologista-obstetra, que confirma, isso sim, a relação entre gravidez e incontinência urinária de esforço: “Na incontinência urinária de esforço há uma alteração no suporte e no mecanismo de encerramento da uretra, nomeadamente quando aumenta a pressão dentro da barriga. Aí a gravidez atua de vários pontos de vista: por um lado, o útero grávido provoca um aumento da pressão abdominal; por outro, há alterações hormonais que modificam a resistência dos tecidos e o próprio parto pode levar à lesão das estruturas de suporte, sejam elas musculares, ligamentares ou das fáscias.”

Como reduzir o risco de incontinência durante a gravidez?

Este risco depende de alguns fatores que não são modificáveis, como o tamanho da cabeça e o peso do bebé. No entanto, há alguns cuidados que podem ajudar a reduzi-lo, como controlar o aumento de peso. “O que se considera aceitável é cerca de um quilo por mês, mas pode ser menos que isso e o bebé desenvolver-se de forma normal. Em média, a recomendação aponta para 9 a 10 quilos durante a gravidez. Se for uma pessoa demasiado magra, é-lhe permitido aumentar bastante mais do que uma pessoa com obesidade”, salienta Sofia Alegra. Outras medidas da maior importância são, segundo a especialista, evitar a obstipação e fazer fisioterapia para fortalecer os músculos do pavimento pélvico

Como reduzir o risco de incontinência no pós-parto?

Este risco depende de alguns fatores que se relacionam com o parto, como explica Sofia Alegra: “Devem ser evitados partos prolongados e difíceis por via baixa, nomeadamente partos instrumentados (com recurso a fórceps) porque levam ao estiramento dos nervos e dos vasos e ao compromisso/lesão dos músculos e ligamentos. Muitas vezes a incontinência que decorre deste tipo de lesões só se manifesta mais tarde na vida. A enervação daqueles músculos fica comprometida e o seu poder contráctil vai-se reduzindo significativamente, cria-se uma atrofia muscular.”

Perante este risco, “há que evitar fazer esforços que aumentem a pressão intra-abdominal e fazer exercícios para fortalecer os músculos do pavimento pélvico”, sublinha a ginecologista, segundo a qual “os exercícios de Kegel devem ser iniciados idealmente durante a gravidez, porque ajudam a prevenir a incontinência urinária durante a gravidez e no pós-parto.” E se a incontinência urinária se tiver manifestado durante a gravidez, “é mesmo muito importante trabalhar aqueles músculos no pós-parto.”

Como é estabelecido o plano de fisioterapia no pós-parto?

O plano de fisioterapia não se limita à prática de exercícios de Kegel. “É importante ir a uma consulta com um fisiatra ou com um fisioterapeuta e estabelecer um plano de reabilitação pélvica que pode passar pelo biofeedback, pela eletroestimulação ou pela estimulação magnética extra-corporal”, refere Sofia Alegra. Este plano terapêutico pode ser indicado pelo ginecologista-obstetra ou procurado pela própria mulher. “Se a mulher tiver perdas involuntárias de urina e isso não for valorizado pelo obstetra, pode procurar um fisiatra ou um fisioterapeuta e pedir para fazerem reabilitação do períneo”, aponta a ginecologista, sublinhando que “às vezes as mulheres acham que perder urina uma vez ou duas não é incontinência urinária, mas é.”

Que medidas de estilo de vida ajudam a reduzir o risco de perdas de urina?

Há várias medidas que visam diminuir a pressão intra-abdominal, nomeadamente:

  • Perder peso, se este for excessivo;
  • Evitar exercício físico muito exigente, que exerça demasiada pressão no abdómen. Por exemplo, agachamentos, exercícios com pesos ou com grande impacto no solo;
  • Evitar fumar: “A tosse crónica e bronquites exercem pressão adicional sobre o abdómen, que se faz sentir no períneo”, indica Sofia Alegra;
  • Promover o funcionamento regular do intestino sem grande esforço – a prisão de ventre aumenta o risco de incontinência urinária;
  • Não esperar até à última para ir à casa de banho. “Leva a uma distensão excessiva da bexiga e isso pode ter interferência na capacidade contráctil do músculo, ao longo do tempo pode ser prejudicial”, explica a ginecologista;
  • Moderar a ingestão de cafeína e de alimentos ácidos (tomate, ananás, vinho, champagne), que podem aumentar a irritabilidade do músculo detrusor e promover episódios de incontinência urinária de urgência;
  • Beber 1L a 1,5L de água por dia, a menos que haja indicação médica específica para outra quantidade. “Beber pouca água pode tornar a urina muito concentrada, com substâncias irritantes da bexiga e que levam a urgência miccional, enquanto beber água em excesso leva à distensão excessiva da bexiga”, justifica Sofia Alegra.

Quais os erros a evitar durante a gravidez e no pós-parto?

A resposta da ginecologista é categórica: “O principal erro é as mulheres não se queixarem quando têm incontinência urinária e não desencadearem o processo que as irá conduzir à fisioterapia.”

 

Tome nota

O risco de incontinência urinária de esforço é maior no último trimestre de gravidez, devido ao aumento da pressão intra-abdominal. Também aumenta para quem tem mais filhos, quando o parto é vaginal e instrumentado (fórceps) e quanto maior a idade da mãe no primeiro parto.

 

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